Rotas dos Azulejos - Gilberto Renda
12 V · PATRIMÓNIO AZULEJAR FERROVIÁRIO TIPOLOGIAS Na tradição de revestimento parietal, na sua integração na arquitetura, a azulejaria encontra nos edifícios das estações de caminho-de-ferro um suporte de eleição para a expressão das suas potencialidades pictóricas. É nas faces vidradas e através do desenho, da cor, do claro-escuro dado pela pincelada rápida, por vezes do relevo e, sobretudo, através do brilho, do seu reluzir, que se acentua e estrutura a modelação das superfícies. No caso dos painéis figurativos, e numa primeira fase, a temática preferencial são as paisagens e sítios, usos e costumes, tradições e fainas agrícolas ou piscatórias, constituindo como que “bilhetes-postais” de cada localidade. As diferentes fontes de inspiração provêm muitas vezes de gravuras ou fotografias, revelando a intuição e competência dos pintores de azulejos na adaptação dessas imagens à escala monumental da arquitetura. As técnicas industriais e artesanais mais frequentes são a pintura à mão, diretamente sobre o vidrado, a estampilhagem (uso de máscaras recortadas para passagem dos pigmentos coloridos para o vidrado), a estampagem (impressão por prensagem mecânica de uma estampa sobre a peça vidrada) e o alto e médio-relevo (formas preenchidas com argila, trabalhadas manualmente ou por pressão mecânica). A conceção e a produção dos azulejos, o “saber fazer”, integra-se no registo das boas práticas de património imaterial e na história social do trabalho porque, por mais simples e em mau estado que estejam, são testemunhos de intenções, de vontades, de técnicas e de criatividade. A vitalidade do azulejo, o “belo material”, no dizer do arquiteto João Carlos Loureiro que, no seu livro “O azulejo - Possibilidades da sua reintegração na arquitetura portuguesa”, escreve: A adoção deste material representa a grande originalidade na decoração das fachadas dos edifícios, além de uma economia na sua conservação e limpeza pela duração e proteção que lhes assegura.” O azulejo concorre para acentuar a dignidade da arquitetura dos edifícios e, por conseguinte, para a valorização estética da paisagem ferroviária. O azulejo, quer assumindo-se como elemento ornamental único, quer pela associação coerente com outros elementos dispersos, arquitetónicos ou não, distribuídos ao longo de todo o complexo ferroviário, contribui para o conceito de paisagem ferroviária. Trata-se de um conjunto expressivo, enérgico, que precisa de ser lido globalmente. Neste universo o azulejo participa com a sua superfície vidrada, clara, alegre, num vibrante diálogo de matérias e cores. Casos há em que o revestimento azulejar foi definido em conjunto com a arquitetura em que se insere, e casos em que o revestimento azulejar foi posteriormente aplicado aos edifícios já existentes. “Alguns cobrem a superfície inserindo-se claramente na organização arquitetónica da fachada, marcando os vãos com uma acentuação do desenho que confere ao azulejo mais do que um papel meramente funcional. (…) A presença do revestimento é tão importante que se a dimensão e a escala das componentes arquitetónicas do edifício não fossem tão poderosas, na sua extrema sobriedade, estaríamos certamente em presença de um exemplo em que a arquitetura de suporte seria destruída.”
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